segunda-feira, 30 de novembro de 2009

The Wall

Eu sei que demorei, mas não poderia deixar o mês de novembro acabar sem falar do muro de Berlim. No dia 09 de novembro a Alemanha comemorou (1) 20 anos que ele foi derrubado. Impressionante como os quase 155 kilômetros de concreto influenciaram a história européia e porque não dizer, mundial nos 28 anos em que dividiram a cidade de Berlim em dois blocos. Também é impressionante como até hoje a europa ainda prova o gostinho amargo desse período. Basta dar uma passadinha em Berlim para sentir toda essa história bem de perto.

Quem vai a Berlim pode visitar inúmeros museus que tratam do assunto, mas um dos mais interessantes é o museu do Checkpoint Charlie. Trata-se de um dos pontos da fronteira entre o setor americano e soviético e lá existe a possibilidade de participar de um jogo, no qual o visitante recebe uma identidade de um fictício ex-morador da cidade tentando atravessar a fronteira por algum motivo. Nessa brincadeira, você vivencia o controle que a polícia e o exército faziam na época. Na hora, tudo é bem divertido: eu estava em um carro com mais três pessoas, éramos turistas do lado ocidental e queriamos visitar um parente do outro lado. Nossa festinha acabou rápido porque um de nós estava bebendo uma coca-cola em lata e o ator/policial que estava controlando nosso carro, não gostou nada daquilo. Tivemos nosso acesso negado... Abaixo vocês podem ver algumas cenas de nossa passagem pela "blitz".




Passado o momento das gargalhada e trocas de figurinhas de como a experiência foi interessante, a cabeça vai a mil com os questionamentos. Como é que uma cidade inteira conseguiu viver quase trinta anos dividida? 

Algumas das estórias de quem viveu essa divisão, me fizeram chorar. Inúmeras pessoas viram suas vidas alteradas, literalmente da noite pro dia, já que a construção começou na madrugada de 12 de agosto de 1961. Em algumas ruas de Berlim, moradores acordaram e deram de cara com o muro na sua janela. Uma das intenções do governo soviético com a construção do muro era evitar a onda crescente de imigração de jovens acadêmicos para o lado ocidental e com isso encarceraram metade de uma cidade. 

Bem, o muro caiu, vinte anos se passaram, mas suas marcas ficaram. E assim como o muro dividiu  Berlim e o país, os sentimentos pós-muro são bem divididos também. Os estados do antigo bloco oeste até hoje pagam imposto de solidariedade, que tem como objetivo revitalizar os estados do antigo bloco leste, o que cria um certo ressentimento dos ocidentais em relação aos orientais. Estes, por sua vez, já estão cansados de serem retratados como os coitadinhos da Alemanha. Além disso, tem aqueles que acham que nos tempos do socialismo eram felizes e não sabiam. Esses são saudosos de um tempo em que o estado regulava absolutamente tudo. Não se podia ter um novo iPod, porque ninguém tinha mesmo e não porque não se tinha dinheiro pra comprar. A liberdade era restrita, mas ninguém era desempregado. 

Por outro lado tem aqueles que se ressentem dessa nova onda de saudosismo socialista, porque foram presos ou torturados por simplesmente terem emitido uma opinião. E isso era mais comum do que eu imaginava. Tem um museu em Berlim somente dedicado aos prisioneiros da polícia comunista onde, além de casos bem sérios, se pode ver também centenas de estórias absurdas, como a da menina de 12 anos que foi interrogada pela STASI (2) por ter riscado um retrato de Stalin. Pessoas que passaram por esse tipo de contrangimento tendem a achar que tudo se dá um jeito de comprar, mas liberdade não tem preço. 

Hoje em dia quando esse papo vem à tona, eu não me acho qualificada o suficiente para opinar. Só sei que toda vez que eu visito Berlim eu sinto o maior respeito por aquela cidade e por esse país de uma forma geral. Admiro a forma como os dois blocos conseguiram sair de uma história cruel de tão estranha e evoluir para um país no qual o capitalismo ainda não é selvagem. O governo ainda se sente responsável por colocar ordem no terreiro. Aqui essa coisa de simplesmente chegar e começar um império no qual só se lucra ainda não cola muito, não. Existe pobreza, sim e ela tem aumentado a cada ano, mas a diferença é que isso aqui ainda choca, contrange, deprime e por ainda não ser aceito como normal, de leste a oeste, as pessoas um dia botam a boca no trombone, vão atrás de seus direitos e por serem insistentes e se recusarem a agir como se estivessem pedindo favor ao governo, acabam conseguindo fazer seus direitos valerem.

P.S.  Os alemães se envergonham um pouco dos Scorpions, não sei por que (hahaha) mas aqui vai o link para um video com imagens do dia em que fronteira entra as duas partes de Berlim foi aberta,  com a música que a banda compôs depois da queda do muro.
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(1) A comemoração foi linda. O vídeo é para quem entende alemão, mas lá pelo sétimo minuto, dá pra ver a festa que foi com a derrubada dos dominós.
(2) A STASI era a polícia do ministério de segurança interna da antiga RDA, ou antiga Alemanha Oriental. O museu a que me refiro é o Memorial Hohenschönhausen que funcionou como uma prisão comunista. Vale à pena uma visita, também.



11 comentários:

  1. pena que outros muros não cessam de ser construídos por aí, né?... pensei em comentar também sobre esses tais "museus do sofrimento", mas pelo visto tô meio melancólica hoje....
    deixo o link para um artigo (en español) de George Yúdice sobre o assunto, para ampliar o debate: http://www.clarin.com/suplementos/cultura/2005/08/27/u-1040448.htm

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  2. Esse eh um assunto muito polemico..."Os alemães se envergonham um pouco dos Scorpions"???????
    Ta brincando neh? A melhor banda de heavy q jah saiu dai. Deviam se envergonhar do rammstein (principalmente depois do ultimo clip deles hahahahahah - sabe q desse eu gostei?).

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  3. Muito engraçadinho... (sobre o comentário logo acima) e, como sempre, muito bacana o seu post, Cris! Achei interessante a dramatização que o museu oferece. É para aprender mesmo. E nunca esquecer!

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  4. Cris, acabo de ver o video e me emocionei MUITO!! Que lindo ver todas aquelas pessoas, as suas expressões de liberadde, alegria, alívio, vitória... E as caras dos policiais da fronteira? Até eles sorriam aliviados! Quero que um dia o nosso mundo inteiro seja assim: sem fronteiras! "Imagine there's no countries / It isn't hard to do
    Nothing to kill or die for / And no religion too / Imagine all the people / Living life in peace" Bjs!!

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Finalmente conseguiu ler todo o artigo do Clarin que Silvinha mandou por link. Concordo com o que li (se é que entendi direito com meu excelente Espanhol). Meu primeiríssimo sentimento quando soube que nós poderíamos participar da encenacao no Checkpoint Charlie foi ficar me sentindo meio estranha. Lembro de ter comentado também com Michal pra mim era estranho estar fazendo de teatrinho o que para outras pessoas foi um sentimento de humilhacao real. Mas enfim... nós seres humanos gostamos de show mesmo e curiosamente aprendemos muito com isso também. Tem determinados fatos históricos que você tem consciencia que existem, mas o nível de reflexao que se atinge é bem mais profundo(espero) se você consegue alcancar a empatia das pessoas. Me parece que a melhor forma de despertar essa empatia é colocando o povo pra sofrer junto hehehehe.

    O comentário sobre as outras barreiras invisíveis que se constróem o tempo todo aqui, me inspirou para mais um post. Beijocas Silvete e valeu!!

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  7. Vários comentários inspiradores, obrigada!!!

    Quanto a estória dos Scorpions, eu conheco gente que gosta, mas é um público mais velho. Eu tenho uma turma da terceira idade que quando eu levei uma música deles pra aula, a galera cantou (isso nunca tinha acontecido antes) e se empolgou de verdade. Mas quando falo de Scorpions com a galera de minha idade, a galera sempre faz cara de nojo... um amigo alemao chegou até a me pedir desculpas pelo tipo de música que a Alemanha espalhou pelo mundo (se referndo aos Scorpions).

    Eu nao levo essa banda muito a sério,nao, mas a música deles nao me agride como a do Ramstein... Curiosamente existe um público grande que curte Ramstein e outras bandas parecidas aqui.

    Queria muito entender de música, pra escrever um post sobre isso também... mas meus conhecimentos musicais se limitam a samba e musica muito brega mesmo, por isso acho melhor nao provocar ninguém. Ou quem sabe eu deva provocar mesmo?

    Valeu o comentário, Beto!

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  8. amiga, com relação aos "outros muros", não pensei exclusivamente na alemanha....

    e quanto ao post de samba e música brega, bring it on!!

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  9. e beto, colé a sua? scorpions?? fala sério!! hahahahaha

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  10. Este comentário foi removido pelo autor.

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  11. 1.Marilena Chauí, grande pensadora brasileira, em 1989, disse: " o muro só caiu pq outro já foi levantado". Estava certíssima;
    2.Tive no museu do Checkpoint Charlie e é, de fato, emocionante. Contudo, é preciso relativizar pois esta é somente a versão fo vencedor(?). Tendemos a demonizar o que houve no bloco socialista muitas vezes em função da supremacia do pensamento capitalista na atualidade;
    3. Algumas nações não aprenderam e continuam construindo muros, vide Jerusalém;
    4. Há os muros invisíveis que reforçamos todos os dias sem mesmo perceber;
    5. Sou completamente solidário aos alemães q se constrangem por serem conterraneos dos Scorpions. A nossa sorte é q os nossos motivos de constrangimento não excedem as fronteiras brazucas. Imagine se Chiclete com Banana fosse sucesso mundial? Seria tão constrangedor para nós como Celine Dion é para os canadenses ou Tom Jones para os ingleses.

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