domingo, 22 de junho de 2014

Sem medo de ser triste

Escravo da Alegria é uma música de Toquinho e Vinicius que eu amo, mas que ultimamente tem me irritado um pouco quando escuto. A questão é que hoje em dia, ao contrário do que eles cantam, ser ou (pior ainda) parecer estar feliz, não só é normal como uma verdadeira obrigação. Só que aqui entre nós, isso é uma farsa que além de cansativa, ninguém aguenta manter.




Antes de continuar, deixa eu esclarecer uma coisa: A-D-O-R-O a alegria, acho bacana ser feliz e prefiro o riso ao choro, sempre. Na verdade, não tenho problema nenhum em dizer que me considero uma pessoa hilária e constantemente recebo confirmações disso através de meus amigos e conhecidos. Muita gente ri das besteiras que falo, me diz que eu sou engraçada etc. Minha sogra (vejam bem, MINHA SOGRA!!!) me chama carinhosamente de "Solzinho" porque segundo ela quando eu apareço todos sorriem. Que meigo, né? Pois é. Isso é a prova de que eu sou do time do alto-astral.



Mas mesmo sendo fã da leveza e da felicidade, eu ainda acho que o ser humano tem direito ao mau humor e mais importante ainda, à tristeza e à melancolia. Fazer de conta que esses sentimentos não existem faz mal à saúde e à qualidade dos relacionamentos que temos com outras pessoas. Ao meu ver, viver em um mundo no qual só se pode sorrir e ser feliz, mesmo quando nosso coração nos diz que estamos tristes, faz tão mal à alma quanto quando só se odeia, só se desespera, chora e se fala de coisas ruins.



Nossos sentimentos negativos também tem uma razão de ser. Sou a favor de tentar exergá-los de forma crítica, de tentar entendé-los e significá-los. Acredito que é simplesmente neurótico viver negando suas manifestações e que é mais saudável aceitar que eles existem tanto em nós quanto nos outros e que de vez em quando, temos de lidar com eles e senti-los mesmo.



É interessante que hoje em dia se fala tanto em ser feliz, existem tantos adeptos da alegria contínua e positividade incondicional e que no entanto as pessoas reclamem tanto da vida, dos vizinhos, do trabalho, das festas que frequentam, dos seus relacionamentos... Eu acho que isso é sintoma de uma sociedade meio fútil, que é obcecada com tudo que é rápido e superficial. Não dá tempo de ser ou sentir nada de verdade, só de parecer e de mostrar. Acaba que proibimos nossa tristeza de dar as caras e nossa alegria nem é assim tão feliz quanto parece.



Nossos sentimentos negativos são excelentes professores que se bem observados podem nos ensinar lições valiosíssimas sobre quem verdadeiramente somos. Só que para aprender suas lições é preciso paciência, determinação, disposição para refletir e ir fundo nas questões que vão surgindo desse contato. Mas isso custa tempo, dá trabalho e muitas vezes é doloroso. O que é uma pena, porque quando não negamos nossa tristeza, nossa raiva, nossas confusões, nossas vulnerabilidades, ficamos mais leves, mais completos, mais interessantes e até mais humanos. Sei lá, acho que até nossa felicidade quando vem, é mais autêntica.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Caridade

Recentemente um milionário estadunidense começou uma brincadeira de esconder dinheiro por Los Angeles e São Francisco numa espécie de caça ao tesouro. Tudo que se sabe dele é que tem entre 35 e 45 anos, que sua fortuna vem do setor imobiliário e que ele dá dicas sobre os lugares onde esconde o dindin através de uma conta no tweeter. Um amigo meu estava me contando que muitas das pessoas que encontram a grana, escrevem pra ele agradecendo e contando como usaram o dinheiro. A maioria acaba gastando pelo menos parte dela ou com outros participantes da caçada ou em outras boas ações.



Esse acontecimento acabou virando um assunto recorrente tanto em meu círculo de amigos como em minhas turmas. Comecei a ouvir muita gente criticando e questionando esse tipo de brincadeira e outras formas de caridade. Muita gente acha realmente ridículo e considera duvidosa a motivação por trás desse tipo de atitude. Um aluno iniciou uma discussão, que rendeu pano pra manga, na qual ele debateu calorosamente as questões morais por trás do que leva pessoas, principalmente em países desenvolvidos, a promover eventos de caridade chiquérrimos para arrecadar doações para alguma instituição. Outros deram exemplos de pessoas que fazem trabalhos voluntários só pra se auto-promover e posar de bom moço. Meteram também o pau nas pessoas que ajudam alguma organização somente com o intuito de ter uma coisa social pra colocar no currículo e com isso se destacarem no processo de seleção de alguma universidade de prestígio ou vaga de emprego concorrida.



Eu entendo as críticas. No mundo ideal, nossa motivação para ajudar o próximo deveria ser a mais pura bondade de nossos corações e o desejo genuíno de ajudar alguém e não só se aparecer ou o pensamento de que vantagens aquela experiência irá nos trazer. Mas isso seria em um mundo ideal, que todo mundo sabe, o nosso está longe demais de ser. Senti um certo incômodo durante toda aquela discussão e acabei por me fazer outro questionamento completamente diferente: por que a gente se apressa tanto em julgar a motivação dos outros?



Tudo bem, doar dinheiro pra uma organização porque a gente sabe que vai poder abater do imposto de renda pode até soar meio egoísta. Eu de fato acho uma pena que nós chegamos a um nível de egoísmo tal que ajudar alguém só entra em questão se pudermos de alguma forma tirar proveito da situação, mas ainda assim, eu nunca ouvi dizer que uma intituição de caridade já tenha recusado um cheque de alguém por que soube que a intenção de quem estava doando era meio mesquinha

Muitas instituições dedicadas a ajudar lidam com falta de recusos e não com excesso de doações e ajuda de pessoas egoístas, só interessadas em tirar onda. Uma vez entrei em contato com uma organização que eu queria ajudar e sem eu ter perguntado qualquer coisa, eles foram bem rapidinhos em me informar todas as vantagens que eu poderia ter ao dar minha contribuição. Ou seja, uma espécie de "pouco me importa qual a sua intenção, me ajude por favor! Vai ser bom pra você também".



Nosso mundo anda muito carente de boas ações. A gente passa muito tempo fazendo e se ocupando de inutilidades e enquanto isso as questões importantes do mundo estão aí se multiplicando e passando da hora de receberem atenção de verdade. Muita gente usa e abusa da capacidade de refletir e criticar. Nos habituamos a ficar procurando o que há por trás de tudo como se os eventos da vida fossem uma interminável fila indiana e nesse processo esquecemos de adicionar um pouco de ação ao processo todo. Nossa habilidade de pensar de forma crítica vira julgamento e já que esses julgamentos que fazemos dos outros quase nunca vem acompanhados de sugestões de como proceder melhor, o resultado é esse que temos aqui: uma classe média e elite mundial altamente arrogante super rápida ao julgar os outros, mas inerte, inútil e pouco crítica em relação a si mesma.



Talvéz eu esteja sendo ingênua em acreditar que se comprometer com a alguma causa ou com alguém que precise de ajuda seja mais importante do que os motivos que levam alguém a fazer isso. Eu prefiro ser ingênua do que amarga. Mas como sei que fazer julgamentos faz parte do ser humano, aqui vai o meu: acho a maior besteira essa mania de criticar tudo, e olha que eu adoro criticar também. Criticar é bom e todo mundo gosta, mas a gente precisa aprender a determinar prioridades. Já que não dá pra se ter boa intenção e boa ação ao mesmo tempo, permitam que pelo menos as boas ações continuem sendo feitas. E ao invés de ficar parado, só criticando motivações dos outros, que tal descer do pedestal, arregaçar as mangas e ajudar também?